Durante os oito anos do governo Lula, a diplomacia brasileira, recorrentemente, recusou-se a apoiar resoluções internacionais de condenação a países acusados de violações de direitos humanos. Nas votações na Organização das Nações Unidas (ONU), a posição mais comum do Brasil foi a abstenção (leia quadro abaixo). Para o Itamaraty, lições morais pouco contribuiriam para melhorar a situação das vítimas de abusos. Mais produtivo seria tentar mudanças pela via do diálogo.
NOVO RUMO
O ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota. Ele pediu aos embaixadores sugestões sobre a política externa
Por trás desses argumentos, havia o ceticismo em relação às questões de direitos humanos de ideólogos da política externa, como o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, segundo homem na hierarquia do Itamaraty durante quase sete anos. Pinheiro Guimarães postulava que a defesa dos direitos humanos “dissimula, com sua linguagem humanitária e altruísta, as ações táticas das grandes potências em defesa de seus interesses estratégicos”. Essa diretriz “anti-colonialista” significou, na prática, o apoio do Brasil a alguns dos regimes mais execrados na comunidade internacional, como as ditaduras que governam a Coreia do Norte e Mianmar. O ponto mais baixo dessa política, talvez, tenha sido a declaração do ex-presidente Lula em viagem a Cuba, no início de 2010, em que comparou dissidentes políticos em greve de fome a bandidos comuns de São Paulo.
Na campanha eleitoral, a presidenta Dilma Rousseff já havia dado sinais de que daria uma guinada nessa orientação. Ela assinou um documento em que se comprometeu a “conferir primazia aos direitos humanos a outros interesses na política externa”. Eleita, criticou a posição do Itamaraty de se abster na votação da resolução da ONU que condenava o Irã por práticas medievais como o apedrejamento. Na semana passada, ela deu mais duas indicações de que pretende, nessa área, estabelecer diferenças marcantes em relação a Lula. Na Argentina, destino da sua primeira viagem internacional, disse que “todas as falhas que existam em relação a Cuba” no campo dos direitos humanos devem ser protestadas. Ao mesmo tempo, tornou-se público que o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, pediu a embaixadores uma reavaliação da política externa, com o objetivo, entre outros, de rever a relação com regimes autoritários.
“Não vamos virar a Noruega, mas o governo vai passar a defender valores que estão em sintonia com a realidade democrática brasileira”, diz Eduardo Viola, especialista em relações internacionais da Universidade de Brasília (UnB). É um avanço promissor.
NEUTRALIDADE POLÊMICA | |
No governo Lula, o Brasil se absteve se condenar regimes acusados de violações | |
IRÃ Desde 2004, o Brasil se abstém, regularmente, em todas as votações da Assembléia Geral da ONU que aprovaram condenações ao regime iraniano por violações de direitos humanos | |
COREIA DO NORTE Em 2008 e 2009, o Brasil se absteve, no Conselho de Direitos Humanos da ONU, de condenar o regime do ditador Kim Jong-Il, acusado de torturar e executar dissidentes políticos | |
MIANMAR Em 2010, o Brasil não apoiou a resolução da ONU que pedia a libertação de mais de 2 mil presos políticos pela junta militar que governa o país do Sudeste asiático | |
SRI-LANKA Em 2009, o Brasil não apoiou investigação de violações de direitos humanos durante a guerra de 25 anos entre o governo cingalês e a guerrilha dos Tigres de Libertação do Tâmil Eelam | |
SUDÃO Em 2006, o Brasil não apoiou resolução que criticaria o governo sudanês e pediria o envio à Justiça dos responsáveis pelo massacre de mais de 200 mil pessoas em Darfur |
Nenhum comentário:
Postar um comentário